domingo, 4 de janeiro de 2009

For no one.

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A noite é escura. Negra.
Estou sozinha, como nunca estive antes. Não há ninguém em minha vida, ninguém em meu coração.
Até que aparece alguém. E a noite se torna mais escura. Escuto um grito agudo, horrível. Um grito de dor e angústia. Um grito vazio de vida. Será que sou eu que grito? É a Morte. Ela chega bem perto de mim, escorre uma gosma que parece um sangue esbranquiçado de seus dentes afiados. Ela não consegue manter sua lingua dentro de sua boca. Com suas unhas tão compridas que revelam sua eternidade, ela toca em meu ombro. Eu pergunto se chegou a minha vez. Ela diz que não. Que eu ainda devo sofrer muito antes e que estará comigo, aguardando que meus olhos estejam secos, meus ossos quebradiços, minha pele podre. Estranhamente eu me alivio. O grito não era meu. Eu não estou mais sozinha. Há um demônio medonho a compartilhar meus passos na penumbra da vida. De uma vida que agora, mais do que nunca, é densa, dolorosa, manchada de um sangue negro e borbulhoso. Um sangue que correu pelo meu corpo durante muitos anos. Agora há alguém em meu coração. Alguém que fará com que ele se deteriore, pouco a pouco. Alguém que me suga a vida e transforma toda a alegria e brilho de meu espírito em algo fétido e repugnante. Já posso sentir os parasitas se multiplicando. Porém, eu não estou mais sozinha.
Enquanto meus olhos não secam, eu sigo pela noite negra. Apenas esperando os momentos em que a dor será mais intensa, em que o ódio, rancor e mágoa controlem como um câncer todo meu coração que, bombeando o sangue envenenado por todo meu corpo, o fará lentamente todo seco. E então aquele grito será o meu. E entrarão vermes pelos meus ouvidos. E eu sei que nesse momento o alívio será de todos os que um dia tiveram o desprazer de conhecer essa pessoa tão pequena e desprezível quanto seu corpo invisível submetia os pensamentos alheios. O alívio estará nos sorrisos envergonhados daqueles que desejaram com tanto ardor a minha partida.
Enquanto isso, sigo pela noite negra. Em busca de um calabouço onde eu possa me esconder e esperar pela dor, que já começa a ser maior, pelas punhaladas cortantes e traiçoeiras das recordações que surgem espontaneamente, mostrando que em minha vida nunca houve amor, que eu sempre fui um incômodo para todos.


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4 comentários:

t disse...

for no one é minha música favorita dos Beatles... uma das...

t disse...

Gostei do texto. Muito bacana. Explica um pouco do que eu sinto em noites escuras.

Juju disse...

eu amo beatles... desde sempre!
essa música e esse álbum tem um significado especial, mas qual álbum não tem?? todos eles!!! qual música não tem??? por isso vc diz: uma das..... esse texto nasceu naturalmente; quem teme achará ele horrível, quem vive achará ele verdadeiro. vc acha ele verdadeiro e horrível.

Ladoocultodocerebro disse...

O Texto está sinistro!!! foi um pesadelo revelado ou foi criado quando vc estava acordada mesmo?...não o relí....eu acho que eu sou dos que temem.....mas parece coisa de profissional...de quem ganha dinheiro com histórias macabras...

estou começando a ficar com medo de você e do Theo....